
Chovia torrencialmente. Sentado no antigo restaurante alemão, de frente para a porta, observava a rua sendo lenta e consistentemente tomada pela água que descia do morro próximo. Agora nenhum pedestre se atrevia sequer a caminhar embaixo da marquise. Os automóveis começavam a rarear. Aquela tempestade prometia.
Reparou, desolado, que a garrafa do vinho tinto estava quase vazia. Virou para trás procurando o pessoal da casa e notou que estava só. Como sempre, nem sequer notara que as horas passaram e o domingo terminava. Daqui a pouco o alemão traria a conta, eles fechariam as portas do estabelecimento e iriam embora.
Uma sequência de trovões interrompeu seu pensamento e levou a luz de todo o quarteirão. O proprietário veio espiar e os dois ficaram olhando a chuva cair e os brilhos dos relâmpagos iluminarem o interior do restaurante, provocando um efeito estranho de alguma coisa muito antiga.
Considerou que pedir a conta, no escuro, seria uma asneira. Sair para caminhar até sua casa, outra maior ainda. Lembrou da grande chuva de 2011 e da enxurrada que levou ruas, casas, carros, pessoas e animais, destruindo quase toda a cidade. Não morrera simplesmente porque não era sua hora.
Suspirou profundamente, chamou o alemão e pediu para trocar as taças, de preferência as de cristal da Riedel, abrir o melhor tinto da casa e vir lhe fazer companhia. Ainda tinham algum tempo antes da chegada do fim do mundo.
É uma classe. Uma casta. Tomadores de vinho são elegantes. Um tomador de cerveja pediria mais uma, mas para ficar bêbado. Os de vinho não: estes gostam de de apreciar. Grande crônica.
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Vinhos, em qualquer situação, pedem respeito, meu caro amigo. Um abração.
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Um brinde
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